sábado, 30 de maio de 2009

Adolescência

a adolescência é mesmo uma fase de mudanças, e melhor dizendo, difíceis mudanças; como se ja não bastassem as psíquicas pelas quais passei, agora, mais do q antes, enfrento as corpóreas. é estranho ver isso, mas cada vez q tiro a camiseta e me olho no espelho antes do banho, posso perceber como os pêlos no meu peito têm crescido e aumentado o seu volume, ainda são pequenos, e mal fazem uma sombra, mas isso ja me assusta; não só essa mudança me deixa com medo, todas as manhãs, ao lavar meu rosto depois de acordar posso também notar como a minha barba tem se espalhado, cada vez mais, pelo meu maxilar, pelas minhas bochechas, garganta, e meu rosto, como tudo tem se tornado menos visível por causa destes pequenos pêlos; os que ficam ao redor do umbigo crescem mais velozmente do q consigo arrancá-los, e ja estou quase desistindo desta missão, sempre me encontro com algum machucado, ou alguma imperfeição na pele, de tanto q eu ja arranquei pequenos pêlos daquele mesmo poro; os genitais ja me acompanham há algum tempo, e estes não me incomodam, servem para cobrir meu sexo, e não deixá-lo tão à mostra, afinal, é para isso q usamos roupas, e eu diria q esta é a roupa do meu corpo, não q eu me envergonhe do meu órgão, nunca, mas simplesmente sinto q assim ele está mais protegido; a adolescências e suas mudanças, com as crises psicológicas e crises hormonais, quem nunca passou por isso, eu sei, é terrível passar, mas no futuro poderei perceber seus resultados, meu corpo de criança se vai, e é como se uma arnha trocasse seu exoesqueleto, e assim o trocasse, sempre q necessário.
eu posso ver o mundo sendo destruído, posso sentir escombros enconstando em mim, posso perceber como as paredes andam fracas utimamente, vejo portas q não se fecham mais e janelas q estarão para sempre abertas, sinto feridas q me tocam e não se curam, sinto frio e calor ao mesmo tempo, olhares q me desaprovam estão sobre mim em todo instante, cobrança, pressão, sono e tragédia, eu sinto tudo isso e tudo, de repente, veio até mim, chegou como um temporal daqueles q pareciam q não ser mais do q garoas; mentira, eu o vi chegando e sei a causa de tudo isso, eu ouvi os gritos q fizeram as primeiras gotas caírem, eu senti o vento forte no meu cabelo, eu vi o céu escurercer e ficar um roxo escuro, eu vi os raios e os trovões, eu senti tudo, tudo passou diante dos meus olhos, e nem para onde me esconder eu tinha, agora tenho, e sei q mesmo com o mundo se acabando eu só quero estar em um lugar, nos seus braços.

quarta-feira, 27 de maio de 2009

mudanças

não tenho mais escrito muito por aqui; deve ser porque os gritos q soavam aqui dentro se acalmaram, e as águas q antes turbulentas eram, são agora, para mim, como pequenos riachos; tudo tem mudado de lugar, e onde havia dor e medo há agora calma e mansidão; o problema é se meu estômago quiser bater no lugar do coração.

domingo, 24 de maio de 2009

apaziguar/iluminar

como um interruptor vc tem sido na minha vida, um interruptor; tem me trazido a luz e me tirado dos momentos de confusão; me traz paz, descanço, um ombro, e muitas vezes vc é tudo o eu preciso; todo o desespero em q me encontrava vc foi capaz de me faz esquecer, e agora é tudo tão passado; o mar em fúrias q navegava agora se acalmou, a tempestade, momentaneamente, passou; as luzes se acendem quando estamos juntos, e enchergo um mundo sem poeira, sem neblina, sem destruição. interruptor.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

hoje o dia está surpreendente péssimo, e milagre, nem 8h da manhã ainda não são; minha mãe me infernizou praticamente antes de eu abrir meus olhos, o trânsito estava caótico, o metrô loltado e eu não estou nem um pouco afim de ter aula de matemática; suspeito q minha psicóloga tenha dito algo errado aos meus pais, e isso está causando na minha vida; meus problema fúteis continuam os mesmos, mas, há, who cares?

terça-feira, 19 de maio de 2009

culpa

é insuportável o clime q tenho vivido nos últimos dias; não tenho agüentado tanta pressão e esse clima pesado q estou sob, tem sido cada vez mais difícil, e me sinto cada vez mais precionado a ser o q não sou, e pior, usar uma máscara para tal fim; tem sido terrível ver a degradação aos poucos da minha família, e a culpa q sinto por ser o causador de tamanha dor não cabe em mim; é como se um câncer se alojasse em um corpo saudável, e aos poucos o deteriorasse, aos poucos a camada de células cinzas se espalha pelo corpo, transformando em cinza tudo o q toca; ou como o fogo q consome, q acaba, q finda tudo; este tenho sido; a razão de toda a dor.

domingo, 17 de maio de 2009

(in)Segurança

a insegurança sempre foi um dos meus pontos fortes (ou fracos), sempre me acompanhou, e nem da minha sombra se desgrudou; nunca, não me lembro do dia em q tive a segurança de dizer "farei" ou "não farei", não me lembro, e se não me lembro, é pq não existiu. estou numa ótima fase na vida, mas a insegurança ainda ta aqui sentada ao meu lado (ou quem sabe, dentro de mim); e o q se passa é: quero, mas não sei o q tornar-me-ei depois de; tenho medo de me tornar o ciúmes encarnecido, tenho medo de prender-te e de modificar-te, e não é isso o q eu quero, mas é o q eu ja fiz, e tenho medo de tornar a fazer. segurança com vc ja tenho, só falta ter cmg.

sábado, 16 de maio de 2009

amarrações e curas

hoje eu vi uma daquelas placas de joga-se tarô, búzios, e faz-se simpatias/ amarrações para o amor, e foi a primeira vez q eu não anotei mentalmente aqueles 8 digitos q sempre aparecem em negrito na última linha destes anúncios; me parece q hoje entendi q não se deve forçar o amor, não se deve amarrar alguém a vcê, tudo deve vir tranqüilamente, tudo o q tem q vir, virá, uma hora ou outra; hoje eu provei q o tempo cura, q o tempo é bom, q o tempo é grande; há um ano atrás eu nunca (n-u-n-c-a) diria q passaria pelo q passo hoje em dia; tudo mudou, muito se curou, e muito está por vir.

segunda-feira, 11 de maio de 2009

O grito


é para mim q ele olha,e esses olhos arregalados de tanto terror se aterrorizam ao ver o q eu me tranformei; olhe para mim, sou só mais um vazio interior, com um consumismo exacerbado, não-compreendido como todos os outros adolescentes deste mundo, em constantes crises de identidade, em uma família conversvadora; explodido, acabado, hollywood trash, glamour decadente; chocolates, doces, comidas, refrigerantes, e todo tipo de porcaria; sou porcaria, sou tudo o q essa sociedade é, sou todos os problemas, e todo o caos desta cidade; sou tédio, depressão e estresse; sou irritação, sou manhã nublada e tragédia; sou o 11 de setembro, e os atentados ao metrô da espanha; sou o medo instaurado nas pessoas, e a tristeza do suspiro dado no metrô; sou o olhar vazio; a selvageria de um rio, a briga com o diabo, a briga com os anjos, sou, sou sou. tudo primeira pessoa, tudo egoísmo.

sábado, 9 de maio de 2009

Mágoas, mentiras e dinheiro.

equilíbrio? eu acabei de escrever sobre isso, e foi como se essa palavra nunca tivesse saído da minha boca; eu nem tinha tomado o café-da-manhã, e mais uma bomba ja explodira dentro de mim, jogando merda em todos ao meu redor inclusive em meus pais. tudo começou com um "hoje à noite vou ao cinema" e a frase seguinte, dita por meu pai, foi "não, hoje você irá à igreja". e neste exato momento a bomba tocou o solo; nem sei como foi, sei q me vi em pé, aos berros, gritando palavras contra o proferido pela boca paterna; o rio de águas calmas de repente se transformara em um maremoto, com navios, gritos e tudo mais. tentei me acalmar, e então logo começaram as perguntas do porquê não ir à igreja; disfarcei daqui, disfarcei d'ali, e não consegui, soltei a minha verdade; e dói em mim reafirmar a minha verdad; é algo q se eu pudesse, eu não faria, mas foi necessário, e então a briga começou, a gritaria começou, as mãos para o alto, as lágrimas, e todo aquele papo de decepção e "naquele dia, foi como se um filho tivesse morrido para mim"; não é fácil ouvir isso, mas não deve ser fácil falar tbm; muito menos sentir. como uma praga q se alastra pelo campo, ou uma chama de fogo q come o mato, isso foi se estendendo aos mais diversos pontos da minha vida, "nenhuma amiga presta, nenhum amigo é bom, a sua psicóloga é uma merda, e todo o dinheiro q eu gastei com ela vou querer de volta"; "se existisse um remédio q custasse um milhão de reais, eu comprava pra te livrar disso"; falaram sobre mudanças e mais mudanças, e q eu devo mudar, pq isso não me trará felicidade, não é isso o q querem pra mim. a pergunta é, eu quero mudar? mas eles não compreendem q é uma decisão minha, uma escolha minha, e q sim, terei de ser escravo de todas as conseqüências q isso me trará. eles me enxergam como se eu estivesse jogado numa viela, mas, não é assim q estou hoje em dia, não, não é; hoje em dia sei onde estou, sei quem sou e posso dizer q me amo e q tenho auto-estima; não sou mais aquele menino do outubro de 2006, cresci, amadureci; mas ainda não decidi.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

equilíbro

sinto q todo o caos passou da minha vida, momentaneamente. sinto q agora sou um rio de águas calmas, sob total controle. não me sinto mal, e todas aquelas palavras antes vomitadas, hoje se transformaram em poemas não simétricos, sem a preocupação da rima perfeita ou da métrica; minha vida agora é calmaria, e é a melhor sensação q posso experimentar.

terça-feira, 5 de maio de 2009

é, acho q as coisas mudaram, e mudaram ainda não sei se para o bem ou para o mal; espero q para o bem; voltei a sentir cosias q há aproximadamente um ano não sentia, e agora eu as sinto e as controlo; este período de um ano foi essencial para mim, aprendi a controlar paixões, equilibrá-las, o q é fundamental para se viver bem.

domingo, 3 de maio de 2009

O vento

foi para mim como uma grande tempestade de vento; eu podia sentir tudo sendo destruido, podia sentir e ver; mas não podia tocar, não podia materializar a destruição; não podia e nem posso tocar naquela destruição, pois hoje em dia já quase não há, e se há momentos em q me sinto triste, em outros, me sinto inteiro e recontruído; algumas coisas vêm mudando em mim, e não só em mim, mas nessa bagunça em q me transformei por alguns tempos; a tempestade passou, as ambulâncias vieram, veio a ajuda internacional, e veio, principalmente, a força da comunidade para ajudar a recontruir tudo o q era necessário.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

que rostos mais coalhados, nossos rostos adolescentes em volta daquela mesa: o pai à cabeceira, o relógio das paredes às suas costas, cada palavra sua ponderada pelo pêndulo, e nada naqueles tempos nos distraindo tanto como os sinos graves marcando as horas: "O tempo é o maior tesouro que um homem pode dispor; embora inconsumível, o tempo é o nosso melhor alimento; sem medida q o conheça, o tempo é contudo nosso bem de maior grandeza: não tem começo, não tem fim; é um pomo exótico que não pode ser repartido, podendo entretanto prover igualmente a todo mundo; onipresente, o tempo está em tudo; existe tempo, por exemplo, nesta mesa antiga: existiu primeiro uma terra propícia, existiu depois uma árvore secular feita de anos sossegados, e existiu finalmente uma prancha nodosa e dura trabalhada pelas mãos de um artesão por dia após dia; existe tempo nas cadeiras onde nos sentamos, nos outros móveis da família, nas paredes da nossa casa, na água que bebemos, na terra q fecunda, na semente que germina, nos frutos que colhemos, no pão em cima da mesa, na massa fértil dos nossos corpos, na luz que nos ilumina, nas coisas q nos passam pela cabeça, no pó q dissemina, assim como em tudo o que nos rodeia; rico não é o homem que coleciona e se pesa no amontoado de moedas, e nem aquele, devasso, que se estende, mãos e braços, em terras largas; rico só é o homem que aprendeu, piedoso e humilde, a conviver com o tempo, aproximando-se dele com ternura, não contrariando suas disposições, não se rebelando contra o seu curso, não irritando a sua corrente, estando atento para o seu fluxo, brindando-o antes com sabedoriapara receber dele os os favores e não sua ira; o equilíbrio da vida depende essencialmente deste bem supremo, e quem souber com acerto a quantidade de vagar, ou a de espera, que se deve pôr nas coisas, não corre nunca o risco, ao buscar por elas, de defrontar-se com o que não é; por isso, nunguém em nossa casa há de dar nunca o passo mais largo que a perna: dar o passo mais largo que a perna é o mesmo que suprimir o tempo necessário à nossa iniciativa; e ninguém em nossa casa há de colocar nunca o carro à frente dos bois: colocar o carro à frente dos bois é o mesmo que retirar a quantidade de tempo q um empreendimento exige; e ninguém ainda em nossa casa há de começar nunca as coisas pelo teto: começar as coisas pelo teto é o mesmo que eliminar o tempo que se levaria para erguer os alicerceres e as paredes de uma casa; aqueel q exorbita no uso do tempo, precipitando-se de modo afoito, cheio de pressa e ansiedade, não será jamiass recompensado, pois só a justa medida do tempo dá a justa natureza das coisas, não bebendo do vinho quem esvazia num só gole a taça cheia; mas fica a salvo do malogro e livre da decepção quem alcançou aquele equilíbrio, é no manjeo mágico de uma balançaque está guardada toda a matemática dos sábios, num dos pratos a massa tosca, modelável, no outro, a quantidade de tempo a exigir de cada um o requinte do cálculo, o olhar pronto, a intervenção ágil ao mais sutil desnível; são sábias as mãos rudes do peixeiro pesando sua pesca de cheiro forte: firmez, controladas, arrancam de dois pratos pendentes, através do cálculo conciso, o repouso absoluto, a imobilidade e sua perfeição; só chega a este raro resultado aquele que não deixa que um tremos maligno tome conta de suas mãos, e nem que esse tremos suba corrompendo a santa força dos braços, e nem circule e se estande pelas áreas limpas do corpo, e nem intumesçade pestilências a cabeça, cobrindo os olhos de alvoroço e muitas trevas; não é na bigorna que calçamos os estribos, nem inflamável a fibra com que tecemos as tranças de nossas rédeas, pode responder a que parte vai quem monta, por que é célere, um potro xucro? o mundo das paixões é o mundo do desequilíbrio, é contra ele que devemos esticar o arame das nossas cercas, e com as farpas de tantas fiadas tecer um crivo estreito, e sobre este crivo emaranhar uma sebe viva, cerrada e pujante, que divida e proteja a luz calma e clara da nossa casa, que cubra e esconda dos nossos olhos as trevas que ardem do outro lado, e nenhum entre nós há de transgredir essa divisa, nenhum entre nós há de estender sobre ela sequer a vista, nenhum entre nós há de cair jamais na fervura desta caldeira insana, onde uma química frívola tenta dissolver e recriar o tempo; não se profana impunentemente ao tempo a substância q só ele pode empregar nas transformações, não lança contra ele o desafio quem nãoreceba de voltao golpe implacável do seu castigo; ai daquele que brinca com fogo: terá as mãos cheias de cinza; ai daquele que se deixa arrastar pelo calor de tanta chama: terá a insônia como estigma; ai daquele que deita as costas nas achas dessa lenha escusa: há de purgar todos os dias; ai daquele que cair e nessa queda se largar: há de arder em carne viva; ai daqueel que queima a garganta com tanto grito: será escutado por seus gemidos; ai daquele que se antecipa nos processos das mudanças: terá as mãos cheias de sangue; ai daquele, mais lascivo, que tudo quer ver e sentir de moso intenso: terá as mãos cheias de geso, ou pó de osso, de um branco frio, ou quem sabe sepulcral, mas sempre a negação de tanta intensidade e tantas cores: acaba por nada ver, de tanto que quer ver; acaba por nada sentir, de tanto que quer sentir; acaba por só expiar, de tanto que quer viver; cuidem-se os apaixonados, afastando dos olhos a poeira ruiva que lher turva a vista, arrancando dos ouvidos os escaravelhos que provocam turbihões confusos, expurgando do humor das glândulas o visgo peçonhento e maldito; erguer uma cerca ou guardar simplesmente o corpo , são estes os artifícios que devemos usar para impedir que as trevas de um ladoinvadam e contaminem a luz do outro, afinal, que força tem o redemoinho que varre o chão e rodopia doidamente e ronda a casa feito fantasma, se não expomos nossos olhos à sua poeira? é através do recolhimento que escapamos ao perigodas paixões, mas ninguém no seu entendimento há de achar que devamos sempre cruzar os braços, pois em terras ociosas é que viceja a erva daninha: ninguém em nossa casa há de cruzar os braços quando existe a terra para lavrar, ninguém em nossa casa há de cruzar os braços quando existe a parede para erguer, ninguém ainda em nossa casa há de cruzar os braços quando existe o irmão para socorrer; caprichoso como uma criança, não se deve contudo retrair-se no trato do tempo, bastando que sejamos humildes e dóceis diante de sua vontade, abstendo-nos de agir quando ele exigir de nós a contemplação, e só agirmos quando ele exigir de nós a ação, que o tempo sabe ser bom, o tempo é largo, o tempo é grande, o tempo é generoso, o tempo é farto, é sempre abundante em suas entregas: amaina nossas aflições, dilui a tensão dos preocupados, suspende a dor aos atordoados, traz a luz aos que vivem nas trevas, o ânimo aos indiferentes, o conforto aos que se lamentam, a alegria aos homens tristes, o consolo aos desamparados, o relaxamento aos que de contorcem, a serenidade aos inquietos, o repouco aos sem sossego, a paz aos intranqüilos, a humildade as almas secas; satisfaz os apetites moderandos, sacia a sede aos sedentos, a fome aos famintos, dá a seiva aos que necessitam dela, é capaz ainda de distrair a todos com os seus brinquedos; em tudo ele nos atende, mas as dores da nossa vontade só chegarão ao santo alívio seguindo esta lei inexorável: a obediência absoluta à soberania incontestável do tempo, , não se erguendo jamais o gesto este culto raro; é através da paciência que nos purificamos, em águas mansas é que devemos nos banhar, encharcando nossos corpos de instantes apaziguados, fruindo religiosamente a embriagez da espera no consumo sem descanço desse fruto universal, inesgotável, sorendo até a exaustão o caldo contido em cada bago, pois só nesse exercício é que amadurecemos, construindo com disciplina a nossa própria imortalidade, forjando, se formos sábios, um paraíso de brandas fantasias onde seria um reino penoso de expectativa e suas dores; na doçura da velhice está a sabedoria, e, nesta mesa, na cadeira vazia da outra cabeceira, está o exemplo: é na memória do avô que dormem as nossas raízes, no ansião que se alimentava de água e sal para nos prover de um verbo limpo, no ancião cujo anseio mineral do pensamento não se perturbava nunca com as convulsões da natureza; nenehum entre nós há de apagar da memória a a formosa sensibilidade dos seus traços, nenhum entre nós ha de apagar da memória sua descarnada discrição ao ruminar o tempo em suas andanças pela casa; nenhum entre nós há de apagar da memória suas delicadas bontinas de pelica, o ranger das tábuas nos corredores, menos ainda os passos compassados vagarosos, que só se detinham quando o avô, com dois dedos no bolso do colete, puxava suavemente o relógio até a palma, deitando, como quem ergue uma prece , o olhar calmo sobre as horas; cultivada com zelo pelos nosso ancestrais, a paciência há de ser a primeira lei desta casa, a viga austera que faz o suporte das nossas adversidades e o suporte das nossas esperas, por isso é que digo que não há lugar para a blasfêia em nossa casa, nem pelo dia feliz que custa a vir, nem pelo dia funesto que súbito se precipita nem pelas chuvas que tardam mas sempre vêm nem pelas secas bravas que incendeiam nossas colheitas; não haverá blasfêmia por ocasião de outros reverses, se as crias não vingam, se a rês definha, se os ovos goram, se os frutos mirram, se a terra lerda, se a semente não germina, se as espigas não embucham, se o cacho tomba, se o milho não grana, se os grãos caruncham, se a lavoura prageja, se se fazem pecas as plantações, se desabam sobre os campos as nuvens vorazes dos gafanhotos, se raiva a tempestade devastadora sobre o trabalho da família; e quando acontece um dia de um sopro pestileno, vazando nosso limites tão bem vedados, chegar até as cercanias da moradia, insinuando-se sorrateiramente pelas frestas das nossas portas e janelas, alcançando um mebro desprevinido da família, mão alguma em nossa casa há de fechar-se em punho contra o irmão acometido: os olhos de cada um, mais doces do que alguma vez ja foram, serão para o irmão exasperado, e a mão benigna de cada um será para este irmão que necessita dela, e o olfato de cada um será para respirar, deste irmão, seu cheiro virulento, e a brandura do coração de cada um, para ungir a sua ferida, e os lábios para beijar ternamente seus cabelos transtornados, que o amor na família é a suprema forma da paciência; o pai e a mãe, os pais e os filhos, o irmão e a irmã: na união da família está o acabamento dos nossos princípios: e, circunstanciamente, entre posturas mais urgentes, cada um deve sentar-se num banco, plantar bem um dos pés no chão, curvar a espinha, fincar o cotovelo do braço no joelho, e, depois, na altura do queixo, apoiar a cabeça no dorso da mão, e com os olhos amenos assistir ao movimento do sol e das chuvas e do vento, e com os mesmos olhos amenos assistir à manipullação misteriosa de outras ferramentas que o tempo habilmente emprega em suas transformações, não questionando jamais sobre seus desígnios insondáveis, sinuosos, como não se questionam nos puros planos das planícies as trilhas tortuosas, debaixo dos cascos, traçadas nos pastos pelos rebanhos: que o gado sempre vai ao cocho, o gado sempre vai ao poço; hão de ser esses, nos seu fundamento, os modos da família: baldrames bem travados, paredes bem amarradas, um teto bem suportado; a paciência é a virtude das virtudes, não e sábio quem se desespera, é insensato quem se submete." E o pai à cabeceira fez a pausa de costume, curta, densa, para que medissemos em silêncio a magestade rústica da sua postura: o peito de madeira debaixo de um algodão grosso e limpo, o pescoço sólido sustentando uma cabeça grave, e as mãos de dorso largo prendendo firmes a quina da mesa como se prendessem a barra de um púlpito; e apoximando depois o bico de luz que deitava num lastro de cobre mais intenso em sua testa, e abrindo com os dedos maciços a velha brochura, onde ele, numa caligrafia grande, angulosa, dura, trazia textos compilados, o pai, ao ler, não perdia nunca a solenidade: "Era uma vez um faminto".

Raduan Nassar, Lavoura arcaica, capítulo IX
diz tudo, pra mim.